Cirurgia de Bolsonaro em Brasília expõe fragilidade pessoal e tática política em tempos de incerteza
- Marcus Modesto
- 14 de abr.
- 2 min de leitura
A decisão de Jair Bolsonaro de realizar sua mais recente cirurgia em Brasília, e não em São Paulo — onde foi tratado nas cinco ocasiões anteriores desde a facada em 2018 — é um movimento que revela muito mais do que uma simples mudança de equipe médica. Expõe, de forma inusitada, os bastidores emocionais do clã Bolsonaro e as novas estratégias de mobilização política num momento de clara fragilidade do ex-presidente.
A justificativa, segundo a colunista Malu Gaspar, teria vindo de Michelle Bolsonaro. Ela teria preferido evitar São Paulo devido ao trauma da morte da deputada Amália Barros, sua amiga pessoal, que morreu após complicações de uma cirurgia feita pelo mesmo médico que cuidava de Bolsonaro. Trata-se de uma razão compreensível no plano humano, mas que não deixa de causar estranhamento quando projetada sobre a cena pública: em vez da lógica médica ou institucional, o que prevaleceu foi o sentimento pessoal. Num governo que sempre se disse avesso ao “mimimi”, o peso das emoções agora parece ditar as decisões clínicas do principal nome da direita brasileira.
Mais do que isso, o episódio é revelador de uma nova lógica de blindagem em torno de Bolsonaro. Ao ser internado em Brasília, ele fica próximo do núcleo político do PL, da militância fiel e da estrutura de comunicação da família. O hospital vira trincheira. E a cama de recuperação, palanque. Não por acaso, enquanto se divulgava o boletim médico, aliados já vocalizavam críticas ao “represamento” de pautas da direita na Câmara. Tudo dentro do roteiro de vitimização contínua que sustenta Bolsonaro desde a facada de 2018.
A escolha do cirurgião Claudio Birolini, pouco conhecido fora dos círculos especializados, reforça a aposta num “novo ciclo” para o ex-presidente — longe de São Paulo, longe de antigos vínculos, mas ainda orbitando a narrativa de que há uma guerra permanente contra Bolsonaro, seja no Judiciário, na imprensa ou mesmo nas salas de cirurgia.
Ao mesmo tempo, a mudança de cenário revela a ausência de um horizonte claro. A promessa de que esta seria a “cirurgia definitiva” soa mais como desejo do que como diagnóstico. Afinal, quem acompanha a trajetória clínica de Bolsonaro sabe que sua saúde é um elemento recorrente no jogo político: ela surge quando é conveniente, se agrava quando é útil e se ameniza quando necessário.
No fim, o que deveria ser apenas um momento reservado de recuperação vira mais um episódio na longa novela de um ex-presidente que parece incapaz de se afastar do centro do palco — nem que para isso seja preciso transformar o leito hospitalar em símbolo de resistência e estratégia.

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