Do púlpito à cela: o silêncio conveniente de Victor Bonato diante de um caso que ainda ecoa dúvidas
- Marcus Modesto
- 22 de abr.
- 2 min de leitura
Após quase meio ano longe das redes sociais, o influenciador evangélico Victor Bonato reapareceu com um discurso ensaiado, numa tentativa de reconstruir a imagem abalada por um dos casos mais controversos dos últimos tempos envolvendo lideranças religiosas. Bonato, de 29 anos, foi preso em setembro de 2023, acusado de estupro por três mulheres que frequentavam seu grupo espiritual em Barueri (SP). Absolvido em julho de 2024 por falta de provas, ele tenta agora reescrever a narrativa pública que, para muitos, ainda carrega interrogações não respondidas.
No vídeo publicado recentemente, Bonato afirma que tudo não passou de uma vingança arquitetada por mulheres que, segundo ele, “se sentiram traídas” por saberem que haviam se relacionado com o mesmo homem. Para sustentar essa versão, o influenciador admite ter tido relações com as três, mas insiste que tudo foi consensual — uma palavra que, na boca de figuras públicas, vem se tornando escudo e retórica conveniente diante da ausência de provas formais.
A decisão judicial, que absolveu o acusado por “inconsistência nos depoimentos e ausência de elementos materiais”, é um marco importante do ponto de vista jurídico, mas não apaga os questionamentos éticos e sociais que o caso levanta. O próprio juiz reconheceu que as denunciantes mantiveram contato com Bonato após os supostos abusos — algo que, embora juridicamente relevante, não pode ser traduzido automaticamente como consentimento ou ausência de violência psicológica.
Mais grave ainda é a fala da advogada de defesa, Graciele Queiroz, que generaliza casos de denúncia de estupro como mecanismos de “vingança e busca por indenizações milionárias”. A declaração, perigosa e carregada de deslegitimação às vítimas reais de violência sexual, aponta para um discurso que ganha força entre setores ultraconservadores: o de que a mulher que denuncia pode estar mentindo — e que o homem acusado é, quase sempre, uma vítima de armação.
Enquanto isso, o Galpão — grupo evangélico liderado por Bonato — foi dissolvido. Os seguidores se afastaram. As ameaças, segundo o próprio, se multiplicaram. E o influenciador, agora mais discreto, cumpre um “voto de castidade” como se a redenção espiritual bastasse para apagar o abismo moral que separa o púlpito do presídio.
Bonato diz que seu erro foi “espiritual”, não criminal. Mas o caso segue sendo uma ferida aberta no debate sobre abusos de poder em ambientes religiosos e a tênue linha entre carisma e manipulação. A absolvição judicial não significa inocência plena — e o retorno do influenciador, agora com discurso reformulado, merece ser observado com o mesmo rigor que se cobra de qualquer figura pública que diz falar em nome da fé.

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