Mercado financeiro: entre previsões catastróficas e interesses próprios
- Marcus Modesto
- 19 de mar.
- 3 min de leitura
A mais recente pesquisa “O que pensa o mercado financeiro”, realizada pela Genial/Quaest, expõe não apenas o pessimismo dos agentes econômicos em relação ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas também revela um comportamento recorrente do setor: a defesa de seus próprios interesses em detrimento de uma análise equilibrada e isenta da realidade nacional.
Com 88% de reprovação ao governo e um salto impressionante na desaprovação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (de 24% para 58%), a pesquisa reflete mais do que uma avaliação técnica – evidencia a dificuldade do mercado em aceitar políticas públicas que não se alinham cegamente aos seus desejos. Não é novidade que medidas voltadas à distribuição de renda, ao fortalecimento do Estado como agente econômico e à proteção social costumam encontrar resistência em setores que lucram com a desregulamentação e com um modelo econômico que favorece poucos em prejuízo de muitos.
Pessimismo ou torcida contra?
A avaliação alarmista do mercado sobre o futuro da economia não se sustenta em fundamentos concretos. Embora a pesquisa indique que 83% dos entrevistados preveem uma piora econômica nos próximos 12 meses e 58% apontem para uma recessão em 2025, o próprio desempenho recente da economia brasileira desmente esse cenário apocalíptico.
O Brasil fechou 2024 com crescimento do PIB acima do esperado, inflação controlada dentro da meta e avanço em setores estratégicos como a transição energética e a infraestrutura. No entanto, essas conquistas passam despercebidas aos olhos de um mercado que, há décadas, opera sob uma lógica de curto prazo, priorizando ganhos imediatos em vez de estabilidade social e desenvolvimento sustentável.
Além disso, a aposta quase unânime de que a redução das tarifas de importação não ajudará a controlar os preços dos alimentos (90% dos entrevistados) parece ignorar experiências internacionais bem-sucedidas e subestima o potencial dessa medida para aliviar o custo de vida da população – algo que, curiosamente, não figura entre as preocupações centrais dos grandes fundos de investimento.
A seletividade das críticas
Curiosamente, o mesmo mercado que critica duramente a condução econômica do governo Lula adota uma postura muito mais complacente em relação a figuras que defendem uma agenda neoliberal e a retirada de direitos. A pesquisa destaca que 93% dos entrevistados acreditam que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, seria o nome com maior chance de vencer a esquerda em 2026 – uma aposta previsível, já que sua gestão tem se alinhado aos interesses de privatização e flexibilização de direitos trabalhistas.
Enquanto isso, o ministro Fernando Haddad, que tem se esforçado para equilibrar as contas públicas sem abrir mão do investimento social, é alvo de uma desaprovação crescente. Não por acaso, Haddad representa uma visão de Estado ativo que incomoda setores do mercado acostumados a pautar a agenda econômica em Brasília.
Interesses acima do país
A resistência do mercado à reforma ministerial, apontando que 98% dos entrevistados acreditam que ela não resolverá os problemas de governabilidade, revela mais uma vez a dificuldade dos grandes grupos econômicos em aceitar um governo que busca ampliar sua base de apoio sem ceder a pressões corporativas.
É sintomático que o mercado veja com maus olhos a nomeação de Gleisi Hoffmann para a Secretaria de Relações Institucionais (90% consideram um erro), já que sua atuação firme em defesa de políticas públicas mais inclusivas contraria a lógica ultraliberal que muitos desses agentes financeiros defendem.
Quando o mercado quer governar
A pesquisa da Genial/Quaest é mais um capítulo de uma narrativa conhecida: o mercado financeiro não se limita a observar e interpretar a política econômica – ele tenta, ativamente, moldá-la em benefício próprio. As previsões catastróficas, as críticas seletivas e a desconfiança sistemática não são meros reflexos de análises técnicas neutras, mas uma tentativa clara de criar um ambiente de instabilidade que favoreça agendas privatizantes e a diminuição do papel do Estado.
Por trás do suposto “pessimismo” do mercado, há uma realidade mais simples: enquanto o governo buscar políticas que beneficiem a maioria e enfrentem privilégios históricos, encontrará oposição feroz de quem lucra com a desigualdade e deseja um Brasil feito para

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