Morte de Pepe Mujica encerra era de liderança progressista na América Latina
- Marcus Modesto
- 13 de mai.
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A morte de José “Pepe” Mujica marca o fim de um dos capítulos mais emblemáticos da história política latino-americana. Ex-presidente do Uruguai entre 2010 e 2015, Mujica consolidou sua imagem como símbolo de um progressismo pragmático, que aliava reformas sociais ousadas a uma postura de vida austera e coerente com seu discurso.
Sob sua liderança, o Uruguai se destacou como pioneiro em pautas sociais no continente. Foi o primeiro país da América do Sul a legalizar o aborto e a regulamentar o mercado da maconha, além de ter sido o segundo a aprovar o casamento entre pessoas do mesmo sexo. As medidas, majoritariamente adotadas entre 2012 e 2013, projetaram o país como um exemplo global de avanços em direitos civis.
A legalização do aborto, aprovada em outubro de 2012, autorizou a interrupção voluntária da gravidez até a 12ª semana em hospitais públicos. No mesmo período, Mujica liderou a proposta de regulação da maconha, com o objetivo de enfrentar o narcotráfico por meio de uma abordagem alternativa à tradicional política de combate às drogas. “É preciso tomar o problema pelas raízes”, afirmava o presidente.
Mais do que suas reformas, Mujica conquistou respeito internacional por seu modo de vida simples. Assumiu a presidência dirigindo um Fusca 1987 e vivendo com a esposa, a também política Lucía Topolansky, em um sítio nos arredores de Montevidéu, onde cultivava hortaliças. Chegou a doar até 90% de seu salário para projetos sociais. “Não tenho religião, mas sou quase panteísta: admiro a natureza”, disse em entrevista em 2012.
Nascido em 20 de maio de 1935, na capital uruguaia, Mujica iniciou sua trajetória política como militante da guerrilha Tupamaros nos anos 1960, grupo que promovia ações armadas com viés distributivo. Ferido e capturado, passou 14 anos preso, a maior parte sob tortura e isolamento, durante a ditadura militar. Com a redemocratização, foi anistiado em 1985 e ajudou a fundar o Movimento de Participação Popular (MPP), vinculado à coalizão de esquerda Frente Ampla.
Eleito deputado em 1994 e senador em 1999, ganhou relevância como ministro da Agricultura no governo de Tabaré Vázquez. Em 2010, chegou à presidência com amplo apoio popular. Durante sua gestão, o salário mínimo teve aumento de 250%, e os investimentos em programas sociais saltaram de 60,9% para 75,5% do orçamento nacional.
Mujica deixa como legado não apenas uma série de reformas marcantes, mas um exemplo raro de coerência entre discurso e prática na política. Sua morte encerra uma era — e impõe à América Latina o desafio de continuar a avançar em políticas públicas com coragem, ética e empatia.

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