No coração do TJRJ, Amarildo mantém viva a tradição dos engraxates
- Marcus Modesto
- 17 de abr.
- 2 min de leitura
Enquanto a profissão de engraxate praticamente desaparece das ruas do Rio de Janeiro, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) resiste à extinção desse ofício histórico. Quem passa pelo Fórum Central, na Rua Dom Manuel, no Centro da capital, ainda encontra a caixa de madeira, a escova e a flanela de Amarildo José da Rosa, 62 anos, um dos últimos representantes de uma profissão que já foi símbolo das calçadas da cidade.
Todos os dias, próximo aos elevadores do Palácio da Justiça, Amarildo dá brilho não só aos sapatos de magistrados e advogados, mas também à memória viva de uma categoria em desaparecimento. O engraxate que começou a trabalhar aos 10 anos, por necessidade, é hoje um símbolo de resistência e dignidade.
“Comecei porque queria ajudar em casa. Era o mais velho de 12 irmãos e me sentia na obrigação de trazer comida”, lembra Amarildo, que saiu de Japeri ainda menino para trabalhar no Centro do Rio. Hoje, mesmo após cinco décadas de ofício, ele continua fazendo o trajeto diário, com a mesma dedicação de sempre.
Nos anos áureos, chegava a engraxar cem pares de sapato por dia. Atualmente, em meio à popularização dos tênis e sapatênis, o movimento caiu drasticamente. “Tem dia que só consigo fazer dois pares”, lamenta. Ainda assim, Amarildo não reclama. Recebe com gratidão o carinho de servidores, juízes e desembargadores, muitos dos quais se tornaram seus amigos ao longo dos anos. Alguns, inclusive, lhe deram presentes, como a cadeira de madeira que usa até hoje no trabalho.
Depois de anos entre a Alerj e o restaurante Xodó do Paço, foi convidado por um ex-presidente do TJRJ a instalar seu ponto dentro do próprio Tribunal. Desde então, tornou-se parte da rotina da Casa da Justiça fluminense — e um personagem querido por todos que ali circulam.
Morador de Japeri, onde ainda vive na antiga casa dos pais — hoje reformada com o fruto do seu trabalho —, Amarildo se orgulha também da filha, Ingrid, de 28 anos, recém-doutora. Um exemplo de superação que emociona quem escuta sua história.
Como se não bastasse, ele ainda guarda uma lembrança inesquecível: o dia em que conheceu seu xará, Amarildo Tavares Silveira, ídolo do Botafogo e da Seleção Brasileira, que brilhou na Copa de 1962 ao substituir Pelé. “Engraxei os sapatos dele e contei que meu nome era em homenagem a ele. Foi emocionante”, conta, com brilho nos olhos.
No próximo dia 27 de abril, celebra-se o Dia do Engraxate. E se há alguém que personifica essa data com dignidade e orgulho, esse alguém é Amarildo. Seu ofício, quase esquecido nas ruas, segue vivo no coração do TJRJ — graças a um homem que, apesar de todas as dificuldades, segue firme, com a caixa de graxa nas mãos e a história nos pés.


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