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R$ 126 milhões em cinco anos e salários atrasados: o escândalo de São Luiz do Anauá, em Roraima

  • Foto do escritor: Marcus Modesto
    Marcus Modesto
  • 22 de jul.
  • 3 min de leitura

Com pouco mais de 7 mil habitantes, o pequeno município de São Luiz do Anauá, em Roraima, tornou-se símbolo de um dos maiores contrastes entre repasses públicos e gestão financeira do país. Entre 2020 e 2025, a cidade recebeu impressionantes R$ 126 milhões em emendas parlamentares — o equivalente a R$ 17,4 mil por habitante, valor 33 vezes superior à média nacional. Ainda assim, a prefeitura decretou calamidade financeira após não conseguir sequer arcar com a folha de pagamento dos servidores.


A crise expõe o uso questionável dos recursos. Uma das obras mais polêmicas é um portal de entrada com 25 metros de altura, que teria sido inspirado na mansão do cantor Gusttavo Lima. A construção, orçada em R$ 1,8 milhão, foi feita para recepcionar um show que prometia público de 50 mil pessoas — sete vezes a população local. O evento, no entanto, foi cancelado pela Justiça, após ação do Ministério Público que questionou a origem dos recursos.


“É um exagero ter um portal dessa magnitude no menor município do estado. Hoje a gente precisa fazer desvio porque ainda falta uma ponte e asfalto na entrada”, criticou o atual prefeito Elias da Silva, o Chicão (PP), ao UOL.


Denúncias de desvio e obras inacabadas


Chicão, que foi vice-prefeito e secretário de Saúde na gestão anterior, rompeu com seu antecessor, James Batista (Solidariedade), e agora o acusa de comandar um esquema de desvio de recursos públicos. Segundo ele, a cidade foi entregue com obras paradas e cofres vazios.


A nova gestão denuncia pagamentos milionários por estruturas que sequer foram finalizadas:

Parque da Vaquejada: R$ 6,6 milhões

Praça dos Buritis: R$ 3 milhões

Portal da cidade: R$ 1,8 milhão

Casas populares: R$ 1,2 milhão


Além disso, foram identificados R$ 680 mil em consignados descontados dos salários de servidores e não repassados aos bancos.


Os casos foram encaminhados à Controladoria-Geral da União (CGU), Tribunal de Contas da União (TCU), Polícia Federal e Ministério Público. “Precisa chamar atenção dos órgãos de controle para que investiguem e o dinheiro seja devolvido”, cobrou o deputado estadual Gabriel Picanço (Republicanos), que é da cidade.


O “efeito Pix” e o excesso de emendas


Grande parte dos recursos chegou a São Luiz do Anauá por emendas do tipo Pix — modelo de transferência direta para os municípios, com pouca exigência de projeto e fiscalização. O mecanismo, criado para agilizar repasses, acabou favorecendo desvios, como alerta Juliana Sakai, da Transparência Brasil: “Com menos controle, o risco do dinheiro sumir por corrupção ou ineficiência aumenta”.


Roraima, o estado menos populoso do país, tem 15 municípios e a mesma bancada federal que estados muito mais populosos: oito deputados e três senadores. Com isso, a concentração de recursos em cidades pequenas se tornou desproporcional. Enquanto um senador da Bahia divide suas emendas entre 417 cidades, os de Roraima concentram em apenas 15.


Apesar da calamidade decretada, o prefeito Chicão segue aparecendo em vídeos ao lado de parlamentares anunciando novas obras, entrega de tratores, ambulâncias e caminhonetes.


CPI na Assembleia e quebra de sigilos


A Assembleia Legislativa de Roraima abriu uma CPI para investigar o uso de emendas estaduais. Os deputados apuram o desvio de R$ 2,6 milhões destinados à compra de medicamentos e de R$ 900 mil para ambulâncias.


A empresa TechMix, responsável por parte das obras — incluindo o portal — teve seu sigilo fiscal quebrado. O proprietário, Marcio Muller, limitou-se a informar que “sua parte na obra foi concluída”.


Já o relator da CPI, deputado Jorge Everton, denuncia sinais de enriquecimento ilícito do ex-prefeito James Batista: “O James era professor municipal com salário baixo. Agora tem posto de gasolina, fazenda, gado, a mulher dele anda de Jeep, tem casas em outros municípios.”


Procurado, James Batista não respondeu à reportagem.


Enquanto isso, São Luiz do Anauá vive o paradoxo de ter sido o município que mais recebeu dinheiro per capita no Brasil — e, ao mesmo tempo, um dos que mais sofre com obras abandonadas, salários atrasados e suspeitas de corrupção.


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