Aprovação simbólica de Pampolha ao TCE expõe vícios do sistema político fluminense
- Marcus Modesto
- há 1 dia
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A aprovação da indicação de Thiago Pampolha para o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ), nesta terça-feira (20), pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), escancara um ritual que, embora revestido de legalidade, segue distante da moralidade e da transparência que a sociedade exige de um cargo vitalício e de alto impacto nos cofres públicos.
A votação, feita de forma simbólica e unânime, simboliza mais do que consenso político: revela o quanto os espaços de fiscalização das contas públicas continuam sendo loteados entre aliados do poder, sem qualquer escrutínio real sobre a trajetória, a independência ou o preparo técnico dos indicados.
Pampolha, atual vice-governador licenciado e ex-secretário de Estado do Ambiente, será sabatinado por outra comissão ainda hoje, mas o desfecho já está desenhado. A base governista não apenas sustenta sua indicação como acelera o rito legislativo. A sabatina, na prática, será apenas mais uma formalidade para homologar a escolha do Executivo — numa casa em que o contraditório é cada vez mais raro.
Indicação política, cargo técnico
A Constituição permite que pessoas com “notório conhecimento” em áreas como direito, economia ou administração possam ser indicadas ao TCE. O problema não está na regra, mas na sua interpretação flexível e no uso político do critério. Nenhuma linha do currículo de Pampolha indica experiência técnica robusta em auditoria pública ou controle externo. O que pesa, de fato, é seu histórico como político aliado do governador Cláudio Castro — e esse, aparentemente, é o único requisito que importa.
A própria novidade de a CCJ se manifestar pela primeira vez sobre uma indicação ao TCE poderia ter sido uma chance de fortalecer a análise crítica e o debate público. Mas isso foi reduzido a um comentário do deputado Luiz Paulo, o único a questionar minimamente o processo — ainda assim, com base apenas em aspectos legais. Nenhuma pergunta sobre o perfil técnico do indicado, sua capacidade de exercer fiscalização sobre contratos milionários ou de confrontar o governo que o nomeia.
Repetição de um ciclo viciado
O TCE-RJ, que deveria ser uma trincheira contra a corrupção e os abusos administrativos, continua sendo um feudo político. Não custa lembrar que seis dos sete conselheiros titulares foram afastados por corrupção em 2017, no escândalo que ficou conhecido como “Operação Quinto do Ouro”. A corte passou anos com conselheiros substitutos até que o governo retomasse lentamente o controle da composição — sempre por indicações políticas, não por concursos públicos ou critérios técnicos objetivos.
A aposentadoria do conselheiro José Maurício Nolasco abriu a vaga, e a oportunidade de reformular o tribunal foi desperdiçada. Mais uma vez, a governabilidade e o apadrinhamento falaram mais alto do que o compromisso com o interesse público.
Transparência seletiva
O discurso da “segurança jurídica” apresentado por membros da CCJ soa como cortina de fumaça. Transparência real exige sabatinas com transmissão pública, questionamentos incisivos, análise crítica de currículos e histórico de atuação. Nada disso foi feito com profundidade. A legalidade do processo não deve servir de escudo para o silêncio sobre sua legitimidade moral.
Enquanto isso, o cidadão fluminense — que paga salários milionários para conselheiros vitalícios, com direito a carro oficial, equipe própria e aposentadoria integral — assiste de fora mais uma nomeação que reafirma: os donos do poder seguem protegendo seus pares, blindando o sistema e ignorando o que deveria ser o verdadeiro critério de escolha: o compromisso com a fiscalização e a justiça.

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